terça-feira, dezembro 27, 2005

Noia


Chamava-se Noia.
Companheira de brincadeiras, risos, tristezas do dia a dia.
Morreu ontem, ao anoitecer de uma segunda feira chuvosa, atropelada, quando atravessava rua, depois de ter feito uma das coisas que mais gostava : correr atrás dos gatos.

segunda-feira, dezembro 05, 2005

Poesia

Hoje estou numa de poesia. Faz bem à alma, adia a ansiedade, abre o coração ao sonho. Por vezes gostava de SER POETA, para poder transmitir o mistério, os sentimentos, os estados de alma, a beleza, o maravilhoso...
Dois autores, dois poemas é o que no silêncio da noite, a minha noite, eu vou aqui deixar.




Carlos Drummond de Andrade

31/10/1902 -17/08/1987




Amor
Quando encontrar alguém e esse alguém fizer seu coração parar de funcionar
por alguns segundos, preste atenção. Pode ser a pessoa mais importante da sua vida.
Se os olhares se cruzarem e neste momento houver o mesmo
brilho intenso
entre eles, fique alerta: pode ser a pessoa que você está
esperando desde o
dia em que nasceu.
Se o toque dos lábios for intenso, se o beijo for apaixonante e os
olhos
encherem d'água neste momento, perceba: existe algo mágico
entre vocês.
Se o primeiro e o último pensamento do dia for essa pessoa, se a
vontade de
ficar juntos chegar a apertar o coração, agradeça: Deus te
mandou um presente divino: o amor.
Se um dia tiver que pedir perdão um ao outro por algum motivo
e em troca
receber um abraço, um sorriso, um afago nos cabelos e os
gestos valerem mais
que mil palavras, entregue-se: vocês foram feitos um pro outro.
Se por algum motivo você estiver triste, se a vida te deu uma
rasteira e a
outra pessoa sofrer o seu sofrimento, chorar as suas lágrimas e
enxugá-las
com ternura, que coisa maravilhosa: você poderá contar com ela
em qualquer
momento de sua vida.
Se você conseguir em pensamento sentir o cheiro da pessoa
como se ela
estivesse ali do seu lado... se você achar a pessoa
maravilhosamente linda,
mesmo ela estando de pijamas velhos, chinelos de dedo e
cabelos
emaranhados...
Se você não consegue trabalhar direito o dia todo, ansioso pelo
encontro que
está marcado para a noite... se você não consegue imaginar, de
maneira
nenhuma, um futuro sem a pessoa ao seu lado...
Se você tiver a certeza que vai ver a pessoa envelhecendo e,
mesmo assim,
tiver a convicção que vai continuar sendo louco por ela... se
você preferir
morrer antes de ver a outra partindo: é o amor que chegou na
sua vida. É uma
dádiva.
Muitas pessoas apaixonam-se muitas vezes na vida, mas poucas
amam ou
encontram um amor verdadeiro. Ou às vezes encontram e por
não prestarem
atenção nesses sinais, deixam o amor passar, sem deixá-lo
acontecer
verdadeiramente.
É o livre-arbítrio. Por isso preste atenção nos sinais, não deixe
que as
loucuras do dia a dia o deixem cego para a melhor coisa da
vida: o amor.

Carlos Drummond de Andrade


Daniel Filipe

1925/1964


A invenção do amor

Em todas as esquinas da cidade
nas paredes dos bares à porta dos edifícios públicos nas
janelas dos autocarros
mesmo naquele muro arruinado por entre anúncios de
aparelhos de rádio e detergentes
na vitrine da pequena loja onde não entra ninguém
no átrio da estação de caminhos de ferro que foi o lar da
nossa esperança de fuga
um cartaz denuncia o nosso amor

Em letras enormes do tamanho
do medo da solidão da angústia
um cartaz denuncia que um homem e uma mulher
se encontraram num bar de hotel
numa tarde de chuva
entre zunidos de conversa
e inventaram o amor com caracter de urgência
deixando cair dos ombros o fardo incómodo da monotonia quotidiana

Um homem e uma mulher que tinham olhos e coração e
fome de ternura
e souberam entender-se sem palavras inúteis
Apenas o silêncio A descoberta A estranheza
de um sorriso natural e inesperado

Não saíram de mãos dadas para a humidade diurna
Despediram-se e cada um tomou um rumo diferente
embora subterraneamente unidos pela invenção conjunta
de um amor subitamente imperativo

Um homem e uma mulher um cartaz denuncia
colado em todas as esquinas da cidade
A rádio já falou A TV anuncia
iminente a captura A policia de costumes avisada
procura os dois amantes nos becos e nas avenidas
Onde houver uma flor rubra e essencial
é possível que se escondam tremendo a cada batida na
porta fechada para o mundo

É preciso encontrá-los antes que seja tarde
Antes que o exemplo frutifique Antes
que a invenção do amor se processe em cadeia

Há pesadas sanções para os que auxiliarem os fugitivos
Chamem as tropas aquarteladas na província
Convoquem os reservistas os bombeiros os elementos da
defesa passiva
Todos decrete-se a lei marcial com todas as consequências
O perigo justifica-o Um homem e uma mulher
conheceram-se amaram-se perderam-se no labirinto da
cidade

É indispensável encontrá-los dominá-los convencê-los
antes que seja tarde
e a memória da infância nos jardins escondidos
acorde a tolerância no coração das pessoas

Fechem as escolas Sobretudo
protejam as crianças da contaminação
uma agência comunica que algures ao sul do rio
um menino pediu uma rosa vermelha
e chorou nervosamente porque lha recusaram
Segundo o director da sua escola é um pequeno triste
inexplicavelmente dado aos longos silêncios e aos choros
sem razão
Aplicado no entanto Respeitador da disciplina
Um caso típico de inadaptação congénita disseram os
psicólogos
Ainda bem que se revelou a tempo Vai ser internado
e submetido a um tratamento especial de recuperação
Mas é possível que haja outros É absolutamente vital
que o diagnóstico se faça no período primário da doença
E também que se evite o contágio com o homem e a
mulher
de que fala no cartaz colado em todas as esquinas da
cidade

Está em jogo o destino da civilização que construímos
o destino das máquinas das bombas de hidrogénio das
normas de discriminação racial
o futuro da estrutura industrial de que nos orgulhamos
a verdade incontroversa das declarações políticas

...

É possível que cantem
mas defendam-se de entender a sua voz Alguém que os
escutou
deixou cair as armas e mergulhou nas mãos o rosto
banhado de lágrimas
E quando foi interrogado em Tribunal de Guerra
respondeu que a voz e as palavras o faziam feliz
lhe lembravam a infância Campos verdes floridos
Água simples correndo A brisa das montanhas
Foi condenado à morte é evidente É preciso evitar um mal
maior
Mas caminhou cantando para o muro da execução
foi necessário amordaçá-lo e mesmo desprendia-se dele
um misterioso halo de uma felicidade incorrupta

...

Procurem a mulher o homem que num bar
de hotel se encontraram numa tarde de chuva
Se tanto for preciso estabeleçam barricadas
senhas salvo-condutos horas de recolher
censura prévia à Imprensa tribunais de excepção
Para bem da cidade do país da cultura
é preciso encontrar o casal fugitivo
que inventou o amor com carácter de urgência

Os jornais da manhã publicam a notícia
de que os viram passar de mãos dadas sorrindo
numa rua serena debruada de acácias
Um velho sem família a testemunha diz
ter sentido de súbito uma estranha paz interior
uma voz desprendendo um cheiro a primavera
o doce bafo quente da adolescência longínqua

quinta-feira, dezembro 01, 2005

Notícias

Por vezes passa-se algum tempo sem "blogar". Não é que não apeteça, mas outros valores mais altos se levantam, como diria o Poeta. Ou então não apetece mesmo e fica-se quieto, sem escrever nada.
Deixemo-nos de conversa fiada. Muita coisa se tem passado nos ultimos tempos. Notícias não faltam , mas algumas são tão más que nem apetece falar delas.
Para lá da pré-campanha que já começou, a sra Ministra da Educação descobriu que num Estado laico, ao fim de trinta anos, os cruxificos estragam as paredes.
Continua-se a esconder os graves problemas deste país com polémicas desnecessárias. Melhor a sra Ministra se preocupasse com os verdadeiros problemas da Educção e os tentasse resolver.
E notícias por notícias, a Sic garantiu a transmissão integral do mundial de futebol 2006.
O Zé povinho quer é futebol!!!!!!!!!!!!!!!!!!